Tribunal internacional condena 2 ex-diretores do serviço de espionagem sérvio por crimes de guerra

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É a primeira vez que o tribunal com sede em Haia declara culpados agentes do governo sérvio por ações no exterior durante a guerra. Decisão foi anunciada semanas após a confirmação da prisão perpétua dada ao general conhecido como o ‘açougueiro dos Bálcãs’ por ações dentro do seu território. Muçulmana bósnia reza ao lado dos túmulos de mortos no massacre de Srebrenica em 1995, em cemitério na vila de Potocari. Foto de 2005
Elvis Barukcic/AFP
Dois ex-diretores do serviço de espionagem da Sérvia foram condenados a 12 anos de prisão cada por crimes de guerra e contra a Humanidade cometidos durante a guerra da Bósnia de 1992 a 1995.
Os condenados pelo tribunal da ONU são:
Jovica Stanisic, de 70 anos, ex-diretor do serviço estatal de segurança
Franko Simatovic, de 71 anos, assessor de Stanisic no serviço estatal de segurança
É a primeira vez que o tribunal com sede em Haia declara culpados agentes do governo sérvio por ações tomadas no exterior durante a guerra.
A decisão foi dada semanas após a confirmação da prisão perpétua dada ao general conhecido como o ‘açougueiro dos Bálcãs’ por ações dentro do seu território (leia a seguir).
O ‘açougueiro dos Bálcãs’
No início de junho, os juízes internacionais rejeitaram o recurso de apelação apresentado pelo ex-líder militar sérvio da Bósnia Ratko Mladic por genocídio, crimes contra a Humanidade e crimes de guerra cometidos durante o regime de Slobodan Milosevic nos anos 1990 nas guerras dos Bálcãs.
“A câmara de apelações mantém a sentença de prisão perpétua para o Sr. Mladic”, declarou o Mecanismo para os Tribunais Penais Internacionais (MTPI) de Haia, rejeitando o recurso de apelação apresentado pelo ex-general.
Ratko Mladic durante a audiência em que teve seu recurso rejeitado em Haia, na Holanda
Reuters/Jerry Lampen
O veredicto, proferido por cinco juízes do MTPI, que substituiu o Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (TPII) após o seu encerramento em 2017, é definitivo e não pode mais ser objeto de apelação.
Apelidado de “açougueiro dos Bálcãs”, o ex-general foi condenado em primeira instância em 2017, notadamente por seu papel no massacre de Srebrenica, o pior na Europa desde a Segunda Guerra Mundial e um ato de genocídio segundo a justiça internacional.
Preso em 2011 após 16 anos foragido, Ratko Mladic, detido em Haia, é agora um homem idoso de quase 80 anos que sofre de problemas de saúde, segundo seus advogados.
Mais de 25 anos após o conflito, o ex-general mantém uma aura de herói entre os seus apoiadores, mas seu nome permanecerá associado aos crimes da guerra da Bósnia, desde o cerco de Sarajevo ao massacre de Srebrenica, onde mais de 8.000 homens e meninos muçulmanos foram mortos pelas forças sérvias.
Veja abaixo reportagem sobre os 25 anos do massacre de Srebrenica, completados em 2020:
Bósnia relembra os 25 anos do massacre de Srebrenica
Apesar da pandemia, parentes das vítimas, incluindo Munira Subasic, presidente de uma das associações de “mães de Srebrenica”, estiveram em Haia para olhar o “carrasco” nos olhos.
Mulher chora no memorial de Potocari, perto de Srebrenica, na Bósnia, em 2019
Darko Bandic/ AP
Após Milosevic e Karadzic
A defesa e a acusação apelaram do julgamento, no qual o TPII absolveu Ratko Mladic de genocídio em vários outros municípios, o que constitui a maior parte do recurso interposto pelo procurador.
A defesa de Ratko Mladic pediu sua absolvição das acusações de genocídio que lhe renderam prisão perpétua, alegando que eram infundadas.
De acordo com seus advogados, não há conexão entre o ex-general e os assassinatos cometidos em Srebrenica em 1995.
Mladic, considerado até hoje um defensor do povo sérvio por muitos sérvios da Bósnia, afirmou que foi arrastado para o conflito desde o início da guerra na Bósnia (1992-1995), que deixou cerca de 100 mil mortos e 2,2 milhões de deslocados.
Na véspera do veredicto, na praça central da cidade de Bratunac, perto de Srebrenica, cerca de 50 sérvios assistiram à exibição de um filme sobre Mladic.
“Seu trabalho foi grande e nunca deve ser esquecido”, disse à AFP Vojin Pavlovic, presidente da associação nacionalista Istocna alternativa (Alternativa Oriental).
“Você só precisa ser um sérvio para ser sentenciado em Haia”, acrescentou, dizendo que estava “pessimista” sobre o veredicto de apelação do general.
Inicialmente programadas para março de 2020, as audiências foram adiadas primeiro porque Ratko Mladic foi submetido a uma cirurgia de cólon, e uma segunda vez por causa da pandemia de covid-19.
A idade exata do ex-general também é assunto de debate. Ele afirma que nasceu em 12 de março de 1943, enquanto o MTPI diz ter sido em 12 de março de 1942.
Em agosto de 2020, durante o julgamento de recurso, Ratko Mladic declarou que o tribunal era um “desdobramento das potências ocidentais” e afirmou ser “um alvo da aliança da Otan”, acusando os procuradores de retratá-lo em termos “satânicos, traiçoeiros e diabólicos”.
Ratko Mladic é um dos principais líderes julgados pela justiça internacional por crimes cometidos durante as guerras na ex-Iugoslávia, além do ex-líder político dos sérvios bósnios Radovan Karadzic, condenado à prisão perpétua em 2019, e do ex-presidente iugoslavo Slobodan Milosevic, que morreu em sua cela em Haia de um ataque cardíaco em 2006, antes de seu julgamento ser concluído.
O procurador do MTPI, Serge Brammertz, alertou que o julgamento final de Mladic não seria suficiente para encerrar as divisões nos Bálcãs, considerando que marcava apenas o fim de um capítulo.
Veneno no tribunal
Os julgamentos do TPII também ganharam grande visibilidade em 2019 com um episódio chocante: o ex-alto responsável das forças croatas da Bósnia, Slobodan Praljak, morreu em um hospital de Haia depois de ter ingerido veneno na sala de audiência do tribunal.
Ele disse que rejeitava sua condenação de 20 anos de prisão e depois ingeriu diante das câmeras o conteúdo de um frasco que tirou do bolso. Seu advogado de defesa afirmou que se tratava de veneno, e a audiência foi imediatamente suspensa. Relembre o fato no vídeo abaixo:
Comandante condenado na Bósnia toma veneno em tribunal
Juntamente com os bósnio-sérvios, os bósnio-croatas lutaram contra a população muçulmana do país em uma guerra civil no início dos anos 90, após a dissolução da Iugoslávia.
Como ex-comandante militar, Praljak foi condenado por não atuar para conter o cerco e a matança de civis e por ordenar a destruição da ponte de Mostar – uma construção histórica – em 1993, causando “danos desproporcionais para a população civil muçulmana”, segundo os juízes.

Fonte: G1 Mundo